O Brasil
é maior que a Globo (ou “o povo derrotou o golpe midiático”)
Por
Marcelo de Salles (*)
Essas
eleições entram para a História do Brasil como o momento mais nítido em que as
corporações de mídia tentaram impor sua vontade ao povo. Mais do que em 1989,
com a famosa edição do debate entre Lula e Collor. Mais do que em 2006, quando
o foco do debate foi deslocado para pilhas de dinheiro expostas ad nauseam.
Em 2014
apostaram todas as fichas, e a contrário de outras vezes não o fizeram
veladamente. Assumiram seu papel de partido político de oposição, conforme
conclamou Judith Brito, diretora-superintendente do Grupo Folha,
vice-presidente da ANJ e colaboradora do Instituto Millenium.
Faltando
11 dias para o segundo turno do pleito, os institutos de pesquisa davam empate
técnico entre os dois candidatos – Aécio Neves à frente 2 pontos, dentro da
margem de erro.
Como
resposta, a militância de esquerda foi às ruas, os movimentos sociais
organizados reforçaram sua participação na campanha e a candidata à reeleição
partiu para o enfrentamento nos debates. O mote era um só: comparar os governos
tucanos e petistas, o que garantiu vantagem a Lula e Dilma em praticamente
todos os setores. Se o oponente baixava o nível, a resposta vinha à altura.
Nos oito
dias seguintes, Datafolha e Ibope registraram crescimento de Dilma. No primeiro,
de 49% para 53%; no Ibope, de 49% para 54%. Enquanto isso, Aécio caiu de 51%
para 46% (Ibope) e 51% a 47% (Datafolha). Dilma encerrou a campanha com
vantagem de 6 a 8 pontos de vantagem, cenário praticamente impossível de ser
invertido em 48 horas.
Aí surgiu
a capa da revista Veja na sexta-feira, antevéspera do pleito, acusando, sem
provas, Lula e Dilma de terem conhecimento de desvios na Petrobrás. De sexta
até domingo a Veja atingiria algo entre 500 mil e 1 milhão de pessoas. A
maioria das quais, no entanto, já tinham o voto decidido para Aécio. A capa da
veja, por si só, merecia o repúdio na medida em que foi dado pela campanha do
PT. A própria presidenta Dilma usou parte do tempo de propaganda eleitoral para
denunciar a manobra da revista.
No
entanto, foi o Jornal Nacional do sábado, véspera da eleição, o grande
responsável pela interferência na vontade popular. No primeiro bloco, Dilma
recebeu 5 minutos, com destaque no suposto medo de avião e nos problemas com a
voz. Enquanto Aécio teve direito a 5’55’’ a apresentá-lo como alguém
incansável, que trabalha durante o voo e aparece com a esposa e os filhos no
colo (“um cara família”). Em outro trecho, as imagens saltadas em repetição
durante comícios, com a bandeira do Brasil nas costas, revelam, como num filme
de ação, um homem destemido que estaria preparado para conduzir o destino da
Nação.
Logo no
início do segundo bloco, o JN exibiu extensa reportagem sobre a capa da Veja.
Aí, o que era de conhecimento de até 1 milhão de pessoas que já votariam Aécio,
alcançou 30-40 milhões de pessoas, entre os quais um sem número de indecisos.
Isto na véspera do pleito, sem que houvesse tempo para se organizar a
estratégia de enfrentamento desse verdadeiro crime midiático. Como resultado, a
vantagem de 6-8 pontos de Dilma caiu drasticamente, e quando terminou a
apuração as urnas sacramentaram 51,5% x 48,5%.
O povo
derrotou o golpe midiático e deu a vitória a Dilma. Agora o povo quer a
democratização dos meios de comunicação, tarefa prioritária para o próximo
governo. Até porque duvido muito que as forças progressistas vençam em 2018 se
continuarem perdendo a batalha da comunicação.
(*)
Marcelo de Salles é jornalista.
Publicado em Viomundo, em 30/10/2014