Protestos, manifestações e mudanças
O brasileiro se levanta há dias, contra
a corrupção os gastos inúteis e o desmando em todas as áreas da administração pública,
no País. Um senso de indignação generalizado, de já ter tolerado demais,
apanhado demais. Agora o povo reivindica mudanças de procedimentos na gestão
das políticas públicas, nas áreas de saúde, educação e segurança pública e
outros.
Se você foi às manifestações, usa
carteirinha de estudante para ter direito à meia-passagem, à meia-entrada ou à isenção
delas, mas não é estudante, você é apenas parte do problema. Você não tem moral
para reclamar da corrupção deste país. O nome disso tudo é hipocrisia.
Em Sobral, por exemplo. Se você joga tudo
no meio da rua: lixo, entulhos, galhos, restos de construção, papel, latas,
sacos plásticos, dejetos e tudo mais a ermo, você trata a cidade como o seu lixeiro
particular. Mas a cidade é de todo mundo. As ruas estão sujas, nojenta e digna de
repúdio, a culpa é sua.
Aí você vai à rua protestar, tudo bem.
É um direito seu. A final, vivemos uma democracia, numa democracia. Você tem
direito de livre expressão. Vá, reclame, reivindique, proteste, manifeste-se.
Mas, a manifestação é contra você.
Ah, você é ciclista, todo orgulhoso de
ser sustentável, um carro a menos, menos trânsito e menos CO2. Você
reclama da opressão do carro, mais forte, contra a bicicleta, o mais fraco. Mas
você não para no sinal. Não respeita a faixa de pedestres. Você até anda na
calçada, na contramão, de todo jeito, tornando-se o opressor do pedestre. Você
sabe que a calçada é do pedestre, mas você não o respeita, porque você só pensa
em você mesmo. Ah, os outros que se explodam, não é assim? Quer protestar?
Proteste.
Mas não se iluda: A manifestação é
contra você.
Você reclama de cães soltos nas ruas.
Mas você que pode ter um cão preso em casa, pode dar-lhe boa ração, cuidado e
carinho, mas, nas oras que pode leva seu bichinho de estimação à rua, a passear
leva-o para fazer o cocozinho nos canteiros das vias, nos jardins das praças,
nas calçadas, em qualquer lugar. Ninguém admite, mas o resultado está aí:
nossas avenidas, praças e calçadas são um mar de merda. Calçadas, avenidas e
jardins não são a privada do seu totó. E você pensa que é. E não tá nem aí pros
outros. Mas você protesta.
A manifestação é contra você.
Você joga de tudo nas ruas: papel no
chão, sacolas, lixo de toda a espécie, galhos, restos de construção, tudo. Em
terrenos baldios, em esquinas, nas calçadas, em frente à caso dos outros, não
importa. Contanto que não seja na sua. Você quer é se livrar. Os outros que se
explodam. E não faltam desculpas para você não fazer o que é certo. Essa merda
de prefeitura que não instala lixeiras, que não contrata garis, que não manda
carro de coleta, ou não manda equipe para limpar as ruas, né? Prefeito
incompetente, prefeitura inoperante, e mil e outras reclamações.
Na saída do estádio, do boteco, das
barracas de praças, dos clubes, você toma uma cerveja e joga a lata por aí. Come
um torresmo, uma pipoca, toma um sorvete e joga a embalagem em qualquer lugar,
menos numa lixeira. “Ah, todo mundo está jogando, porque eu não posso jogar?
Será que só eu estou errado?”/ “Depois vem a limpeza pública e limpa. Afinal,
eu pago meus impostos para isso. Alguém deve vir limpar. A responsabilidade não
é do Estado, do município, da prefeitura? Eles que se explodam!”
E você, manifestante, onde acha que
está a sua responsabilidade? O que você faz para cumpri-la, todo dia? Você não
pode se esquivar dela durante os 365 do ano, durante os dias da sua vida. Mas
você se esquiva, todo dia. Ah, os poderes que se explodam. Mas você se
manifesta. É um direito seu.
A manifestação é contra você.
Você não cumprimenta o porteiro do seu
prédio. Você explora seu empregado. Você não respeita seu semelhante. Você é só
você. Primeiro, você. Depois, você de novo. Você [é o centro de tudo. Exagera,
horrivelmente, no perfume que você usa nos bifês, nos clubes, no shopping, nas
lojas, na igreja, ou em outros locais aonde você vai. O que importa é que o seu
perfume importado invada o nariz dos outros. Se é fumante aí é que o egoísmo
domina mesmo. Os outros que se explodam!
Você dirige bêbado. Você tem um carrão
de luxo põe um escapamento super estridente, que dá para ouvir a quarteirões de
distância. Você instala um paredão, um som da ,maior potência no seu carro, que
incomoda todo mundo por onde você passa. Todo mundo tem que ouvir a porra das
suas músicas, geralmente de péssimo gosto. Mas você quer ser notado, quer
aparecer e nem aí para o sossego dos outros. O gosto é seu. Você quer é ser notado. Os outros que se
explodam!
Você compra uma moto e ganha um
capacete. Seu capacete só serve para protetor de cotovelo. E sai por aí,
furando farol, desobedecendo sinal,
ultrapassando veículos pela direita, correndo a mil, atropelando e sendo
atropelado. Mas toda a razão no trânsito é sua. E os outros? Ah, os outros que
se explodam.
E você, que, “graças aos seus esforços”,
tem um carrão possante, da moda, que sobe a serra para curtir a vida, e que por
lá enche a cara de bebidas e, ao fim do domingo, desce a ladeira cheio dos paus
e tenta ludibriar ou subornar o policial de trânsito, se esquivando do
bafômetro, e ainda se achando cheio de razão, tenta subornar o guarda ou ameaçá-lo
com o famoso chavão: “Você sabe com quem está falando?”. Você que age assim,
assim mesmo proteste.
Mas a manifestação é contra você.
Ou ainda, você que votou ou vota por
dinheiro, por benefícios individuais ou coisas equivalentes. Você que,
subservientemente, elege políticos sabidamente corruptos e inescrupulosos, sem
compromissos com o povo a quem representa, vá às ruas, esperneie, grite,
levante cartazes, proteste.
A manifestação é contra você.
Até você que escreve textos como este, que
é jornalista, blogueiro, redator ou apresentador de rádio ou de TV, que vive apontando
o dedo contra delitos de quem já cometeu ou ainda comete desmandos
administrativos ou desvios de recursos públicos, achando que dedo em riste
exime você da sua responsabilidade. Você
que comete arbitrariedade contra subordinados, pessoas humildes, simples, empregado(a)s
domésticos etc. Você é parte da
violência. Você é parte da corrupção. Mas proteste. É um direito, nada lhe
impede de protestar, mas saiba:
A manifestação é contra você.
De toda a sorte, uma coisa é certa. Para
mudar tudo que é de errado que aí está, mude primeiro a você mesmo. Se você não
mudar, o país não vai mudar, nada vai mudar. Por isso, não adianta todo mundo
apenas demandar que "o poder” conserte as coisas. Quer mudar Sobral, o
Ceará, o País? Não se esqueça de mudar primeiro a si mesmo, e pagar o preço da
mudança, como uma pessoa adulta, amadurecida, consciente.
Então, amigo, vá pra rua. Já estava
mais do que na hora! Mas, por favor, não esqueça, camarada:
A manifestação é contra você.
(Herculano Costa)
Nenhum comentário:
Postar um comentário