Em 15 anos,
Estatuto do Idoso deu visibilidade ao envelhecimento

Negligência e
discriminação contra o idoso tornaram-se crimes. Estatuto trouxe proteção
integral e
prioridade absoluta às pessoas com mais de 60 anos
(Fotos: Marcelo Camargo/Marcello
Casal Jr/Agência Brasil)
Ver uma pessoa com mais de 60 anos ter prioridade na fila do
supermercado, de bancos, no ônibus ou em outros locais se tornou mais comum no
país. Por vezes ainda desrespeitado, o direito dos idosos
de ter prioridade em diferentes serviços, e outras garantias, ficou
amplamente conhecido depois do Estatuto do Idoso, que completa 15 anos de
vigência nesta segunda-feira (1º).
Criado pela Lei 10.741, em 1º de outubro de 2003, quando o Brasil tinha
15 milhões de idosos, o estatuto trouxe, de forma inédita, princípios da
proteção integral e da prioridade absoluta às pessoas com mais de 60 anos e
regulou direitos específicos para essa população.
“Foi a primeira legislação que de fato passa a regular os direitos
humanos das pessoas idosas. Eu trabalho na área de envelhecimento há quase 40
anos e, na época, nós éramos um dos países que não tínhamos uma legislação que
permitisse penas e sanções administrativas para aqueles que praticassem
maus-tratos e violência”, relata Laura Machado, representante da Associação
Internacional de Gerontologia e Geriatria na ONU e membro do conselho do
HelpAge Internacional.
A partir do estatuto, pela primeira vez, negligência, discriminação,
violência de diferença tipos, inclusive a financeira, e atos de crueldade e
opressão contra o idoso foram criminalizados e hoje são passíveis de punição. O
estatuto também aumentou o conhecimento e a percepção dos idosos sobre seus
direitos.
“O idoso hoje sabe que não pode ser uma voz passiva, que tem direitos
assegurados, isso está muito mais disseminado pela população como um todo. E
não é só em relação a ter preferência na fila ou ter uma vaga para encostar o
carro. Isso melhorou, mas acho que as pessoas se sentem mais empoderadas e
cientes dos seus direitos”, diz Alexandre Kalache, epidemiologista especializado
em envelhecimento.
Kalache, que também é presidente do Centro Internacional de Longevidade,
acrescenta que, apesar de não estar totalmente implementado, o estatuto impede
o retrocesso de direitos já garantidos pela Constituição ou outras políticas
transversais de proteção aos idosos.
“Por termos um estatuto do idoso, nós tivemos recentemente a reversão da
decisão da Agência [Nacional] de Saúde Suplementar, que voltou atrás daqueles
40% de coparticipação nos planos de saúde, porque houve muitas críticas da
sociedade civil, conselhos e outras entidades que disseram isso não pode ser
feito sem uma escuta, um diálogo”, comenta Kalache.
Para a Pastoral da Pessoa Idosa, que desde a década de 90 atende idosos
em condições de vulnerabilidade, o estatuto qualificou a assistência social e
mudou a percepção de outras gerações sobre o idoso. “O fato
de ter uma legislação que assegura direitos dá maior credibilidade,
visibilidade e segurança a todo um trabalho, seja da pastoral, seja de outras
instituições que se dedicam à causa”, afirmou Irmã Terezinha Tortelli,
coordenadora da pastoral.
O secretário nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Rogério Ulson,
lembra que a implementação do estatuto, fruto de mobilização da sociedade,
representou uma mudança de paradigma, “já que amplia o sistema protetivo desta
camada da sociedade, caracterizando verdadeira ações afirmativas em prol da
efetivação dos direitos da pessoa idosa”.
O secretário, no entanto, reitera que a luta envolve ajustes na política
da pessoa idosa e enfrentar desafios culturais, “como de que envelheceu e
acabou: você ganha um pijama, um chinelo e uma poltrona”.
Aprimoramento da legislação
Em âmbito internacional, integrantes de organizações brasileiras estão
articulando junto à Organização das Nações Unidas (ONU) para a aprovação de uma
Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa Idosa.
As organizações também esperam que o Congresso Nacional aprove a
Convenção Interamericana dos Direitos das Pessoas Idosas, instrumento que foi
aprovado por países da América Latina, em 2015, na Organização dos Estados
Americanos (OEA).
A pesquisadora Laura Machado enfatiza que a ratificação da Convenção
Interamericana seria um passo importante para atualizar a política de proteção
dos idosos e avançar em relação às metas estabelecidas no Plano Internacional
de Madri para o Envelhecimento, de 2002, do qual o Brasil é signatário.
A iniciativa de uma convenção internacional tem o apoio do governo
federal. “Significa uma mudança de paradigma da perspectiva biológica e
assistencial para visão social dos direitos humanos, visando eliminar todas as
formas de discriminação. É reconhecer também que as pessoas, à medida que
envelhecem, devem desfrutar de vida plena, com saúde, segurança, e participação
ativa na vida econômica, social cultural e política de suas sociedades”,
declara o secretário Ulson.
Na Câmara dos Deputados, 147 projetos de lei que mudam ou aprimoram
alguns pontos do Estatuto do Idoso estão sob análise. A maioria trata de
mobilidade, acesso à moradia, saúde, direitos humanos e questões relacionadas a
trabalho, emprego e assistência social.
Segundo a secretaria da Subcomissão do Idoso, os projetos mais viáveis
poderão compor um relatório com recomendações para apreciação dos parlamentares
da próxima legislatura.
De Brasília, Débora Brito, repórter da
Agência Brasil, em 01/10/2018, às 08h00



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