Saques de ex-auxiliar de Flávio Bolsonaro ocorriam após depósitos de
valor similar
Senador eleito, Flávio Bolsonaro (Foto: Arquivo/Agência Brasil)
Os maiores saques feitos em 2016 pelo policial militar Fabrício Queiroz,
ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), foram precedidos,
geralmente na véspera, de depósito de valores de mesmo patamar.
Essa movimentação é característica de uma conta de passagem, na qual o
real destinatário do valor creditado não é o seu titular. O uso de dinheiro em
espécie nas duas pontas da operação reforça esse indício.
Queiroz foi citado num relatório do Coaf (Conselho de Controle de
Atividades Financeiras) como tendo apresentado uma movimentação financeira
atípica de R$ 1,2 milhão em 2016. O alerta se deve tanto ao volume como à forma
com que as transações foram feitas. O documento, contudo, não é o suficiente
para apontar algum ato ilegal.
O Ministério Público do Rio de Janeiro instaurou uma investigação
criminal sigilosa com base no relatório, que cita membros do gabinete de 22
deputados estaduais -entre eles Flávio Bolsonaro.
Do total movimentado, R$ 324,8 mil se referem a saques e R$ 216,5 mil a
depósitos em espécie --os demais valores são transferências identificadas,
entre outras operações.
Dos 176 saques realizados pelo policial militar naquele ano, 50 foram de
valores acima de R$ 2.000. Apenas um, contudo, superou os R$ 10 mil, no qual a
comunicação ao Coaf é automática.
Na maioria desses casos, o saque foi precedido de um depósito em espécie
de valor em patamar semelhante. Nenhum, contudo, acima dos R$ 10 mil.
Nos dias 16 e 17 de fevereiro, por exemplo, Queiroz fez três saques de
R$ 5.000 cada um, totalizando R$ 15 mil. O movimento foi acompanhado de cinco
depósitos em espécie feitos em sua conta entre os dias 15 e 17 de fevereiro,
que somam R$ 15,3 mil.
Movimento sincronizado também ocorreu em junho, quando nos dias 14 e 15
ele fez dois saques de R$ 5.000, tendo recebido no mesmo período em depósito de
dinheiro vivo R$ 13,2 mil.
A ocorrência desses saques maiores mantém como padrão o fato de
ocorrerem poucos dias após depósito em espécie de patamar semelhante. Em 35 dos
50 casos de retiradas acima de R$ 2.000, depósito acima do mesmo valor ocorreu
até um dia antes --algumas vezes, no mesmo dia. Ampliando o intervalo entre o
depósito e o saque para três dias, a sincronia se repete em 40 dos 50 maiores
saques de Queiroz.
A correlação entre depósitos em dinheiro vivo e saque imediato também
fica evidenciado em dezembro, quando o total sacado aumenta muito, assim como a
entrada de dinheiro vivo.
No último mês do ano, por 12 vezes ele fez retiradas de dinheiro vivo
acima de R$ 2.000, num total de R$ 58 mil. O volume de entrada também cresce e
alcança R$ 41,6 mil distribuído em oito depósitos em espécie.
Procuradores, policiais federais e auditores fiscais afirmam que o uso
de dinheiro vivo em transações bancárias costuma ter como objetivo ocultar o
destinatário ou remetente dos recursos. A prática dificulta a identificação dos
responsáveis pelas transações.
Uma das hipóteses já levantadas é de que o policial militar fosse o
responsável por recolher uma parcela dos salários de assessores do gabinete de
Flávio Bolsonaro --sete aparecem no relatório transferindo recursos a Queiroz.
Essa é uma prática comum no Legislativo, embora ilegal. Os recursos
arrecadados podem tanto servir para campanhas políticas como para entrega ao
titular do gabinete, entre outras possibilidades.
Não há até o momento, contudo, qualquer indício sobre o destino do
dinheiro sacado por Queiroz. O relatório do Queiroz não foi localizado para
comentar as informações do relatório. Flávio Bolsonaro afirmou que o
ex-assessor lhe deu explicações plausíveis que deverão ser dadas ao Ministério
Público Federal quando convocado.
Do Rio de Janeiro (RJ), Ítalo
Nogueira, FOLHAPRESS, em 11/12/2018
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