Bolsonaro X
Jornalistas: bem feito para os coleguinhas que não se dão ao respeito
Por Ricardo Kotscho (*)
“O pior
é que ele disse a verdade. Isso que vemos hoje não é jornalismo” (Dilea Frate, jornalista, ex-Globo, em comentário no
meu Facebook).
Claro que não podemos generalizar, minha cara Dilea, porque nem todos os
jornalistas se comportam como sabujos do poder -e não é de hoje.
Mas a submissão de boa parte dos profissionais encarregados de fazer a
cobertura dos chiliques diários de Bolsonaro e seus inacreditáveis ministros,
sem nenhuma reação, acaba mesmo dando razão aos que não respeitam mais o nosso
trabalho.
Quando a ofensiva do presidente contra jornalistas e veículos de mídia
chegou a um ponto insuportável, numa escalada de insanidades, nenhuma atitude
mais séria foi tomada para dar um basta a esse esculacho.
Notas de protesto ou de solidariedade das entidades de classe dos jornalistas
e das empresas são inúteis, palavras jogadas ao vento, porque sabemos que essa
gente não lê nada, e está se lixando para a opinião pública. Eles dão risada.
Eu cheguei a propor aqui que os jornalistas e suas chefias simplesmente
se recusassem a participar desta pantomina do circo armado com a plataforma de
microfones no chiqueirinho do Palácio da Alvorada.
Fui criticado por isso, sob a alegação de que é preciso divulgar todas
as besteiras que o capitão fala para a sua claque de seguidores, que fica num
chiqueirinho ao lado, o que já é uma aberração.
Pergunto: custa exigir que a Presidência da República use a sala de imprensa reservada no Palácio do Planalto, quando eu era secretário de Imprensa, em
2003, para o presidente e outras autoridades falarem com os jornalistas,
civilizadamente, todos sentados, e seguindo regras pré-estabelecidas?
Hoje, o governo nem tem mais secretário de Imprensa, cargo vago há
vários meses, mas deve ter alguém autorizado no Palácio do Planalto para
receber representantes da ABI, da Fenaj, da Abert e da ANJ em audiência, porque
do jeito que está não pode continuar.
Se não leem, pelo menos poderiam ouvir que não é mais possível colocar
os jornalistas ao relento no Alvorada, hostilizados por “grupos de apoio” do
capitão, que aplaudem e vaiam como se estivessem num programa de auditório. Até
os circos são mais organizados e respeitosos com seu público.
Para dizer, como fez nesta segunda-feira, que “os jornalistas são uma
espécie em extinção, que o Ibama precisa cuidar”, é porque eles se submetem aos
seus desatinos.
Se o presidente da Republica não se dá ao respeito, cabe a nós,
profissionais, às empresas e às suas entidades representativas zelar pela
dignidade da nossa profissão.
Qualquer presidente de escola de samba ou técnico de futebol consegue
conceder entrevistas coletivas sem a presença de torcidas organizadas.
Por que o Palácio do Planalto não pode? Por capricho do capitão?
Vida
que segue!
(*) – Ricardo Kotscho é jornalista, integrante do
Jornalista Pela Democracia. Publicado em Brasil 247, em 07.01.2020
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