Por Paulo Moreira Leite (*)
O
esforço de Michel Temer e seus aliados para impedir o avanço do julgamento no
TSE se explica por um cálculo evidente. Em posição insustentável, a cassação
dos direitos políticos de Temer abre o debate sobre a escolha do novo
presidente, aquele que irá governar o país até 2018.
Em condições normais, não haveria o que discutir fora da regra
constitucional, que determina a escolha pelo Congresso, em voto indireto, no
prazo de 90 dias.
Mas o país não vive um período de normalidade desde o
afastamento de Dilma sem crime de responsabilidade configurado. Desde o
15 de março de 2017, os brasileiros e brasileiras demonstraram, na rua, que
estão mobilizados para defender seus direitos.
Apresenta-se, então, a situação que os aliados de Temer temem,
mas que a população deseja com clareza e simplicidade: a brecha política que
pode abrir caminho para um movimento por diretas agora, contra um golpe
dentro do golpe.
É esta a possibilidade aberta pelo julgamento no TSE.
Caso o julgamento determine o afastamento de Temer, será o
início do desmonte da articulação que produziu o golpe parlamentar e, sem
consultar ninguém a não ser seus próprios patrões ideológicos, deu início a uma
ofensiva contra direitos e conquistas que a maioria condena sem rodeios.
A coalizão golpista, que já perdeu vários alicerces desde a
posse, estará esfrangalhada -- antes que o novo presidente venha ser
escolhido.
Cientes do risco a ser enfrentado quando o povo se coloca na rua
-- é bom não esquecer da greve geral marcada para 28 de abril, numa mobilização
que está longe dos protestos importantes, mas sem maiores consequências
políticas, de nosso passado -- os aliados de Temer tudo farão para embaralhar o
julgamento, atrasar uma decisão e ganhar tempo. O esforço será concentrado nos
pedidos de vista, destinados a fugir da discussão e evitar um debate sobre o
mérito das denúncias contra Temer.
É sua maior esperança -- mesmo assim, um esforço precário, que
irá corroer a credibilidade que Temer ainda desfruta junto a seus aliados mais
fiéis, socialmente insignificantes, mas poderosos do ponto de vista econômico e
político.
A manobra infantil de tentar separar a chapa, iniciativa
escabrosa, quando se recorda a jurisprudência firmada em casos semelhantes,
confirmada na ação que pediu a impugnação da chapa Dilma-Temer em dezembro de
2014 e a posse de Aécio Neves, perde credibilidade mesmo entre aliados do
governo na mídia amiga. Compreende-se.
Depois de denunciar "doações feitas em decorrência de
benesses ou de abstenção de criar entraves por parte dos agentes da empresa
estatal," o advogado do PSDB, Eduardo Alckmin, escreveu que a
"eleição presidencial de 2014, das mais acirradas de todos os tempos,
revelou-se manchada de forma indelével pelo abuso de poder, tanto político
quanto econômico, praticado em proveito de Dilma e Michel." Está lá, para
não haver dúvidas -- que também foram dissipadas pelos depoimentos e delações
recentes.
A mesma corte que encaminha a convicção para condenar Dilma --
como se todos as acusações estivessem comprovadas acima de qualquer dúvida --
não pode alterar suas convicções e mudar de caminho no caso de Temer. Recorde
seletivo, nem o mensalão PSDB-MG chegou a tamanho disparate.
Apenas profissionais cotidianamente empenhados em procurar
opções favoráveis a Temer conseguem cogitar uma acrobacia especial. Ser cassado
no TSE, preservar os direitos políticos -- como aconteceu com Dilma no Senado
-- e ele poderia ser eleito como presidente pelo Congresso. Fácil de imaginar,
difícil de fazer -- em qualquer circunstância. Ainda mais com o povo na rua e
reprovação recorde. Imagine o que iria acontecer no país.
(*) - Paulo Moreira Leite é jornalista e escritor - Publicado em Brasil 247, em 04/04/2017
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