Análise: abertura tem alívio russo,
decepção saudita e vergonha brasileira
Arábia Saudita tomou cinco gols da Rússia (Foto: Shaun Botterill)
Dentro do
Lujniki, a sensação era mais de alívio do que de êxtase. Pior colocada no
ranking da Fifa (70ª), a Rússia era favorita a repetir a África do Sul em 2010
e se tornar a segunda seleção anfitriã a não conseguir superar a fase de grupos
da Copa do Mundo. Os últimos resultados respaldavam o pessimismo.
A Arábia
Saudita, segunda pior seleção deste Mundial (67ª no raking), tornou tudo mais
fácil ao se permitir tomar cinco gols. O resultado do jogo de abertura da Copa
do Mundo transformou em russa a festa que, pelo menos nas ruas e nos trens de
Moscou, até aqui era bem mais peruana, mexicana, iraniana.
A derrota por 5
a 0 também deixou evidente que o "projeto" saudita para o futebol vai
precisar muito mais do que caminhões de dinheiro, para usar a expressão do
ex-técnico do Corinthians, Fabio Carille, que assinou com o Al-Wehda.
Um vídeo de oito
segundos, que tem como protagonistas Vladinir Putin, o presidente da Fifa,
Gianni Infantino, e o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohamed Bin Salman,
é o melhor resumo do estágio em que se encontra o futebol saudita hoje. Após o
terceiro gol russo, Putin timidamente bate quatro palminhas, então se vira para
Bin Salman, mira as palmas das mãos para cima e abre os braços. Infantino,
constrangido, sorri sem mostrar os dentes e balança a cabeça. Ninguém precisa
dizer uma palavra.
Vergonha maior
que o futebol saudita, só a do futebol brasileiro. Enquanto o mundo inteiro
prestava atenção ao que acontecia no gramado do Lujniki, dirigentes da CBF
tentavam explicar ao mundo o voto do Brasil no Marrocos como sede da Copa de
2026 – quando o acordado, e anunciado, era votar na candidatura de EUA, México
e Canadá, que venceu a disputa.
O responsável
pelo voto do Brasil foi o presidente da CBF, Antonio Carlos Nunes, o Coronel
Nunes. Horas antes do jogo entre Rússia e Arábia Saudita, o presidente da Fifa
foi à inauguração da "Casa Conmebol", espaço que a confederação
sul-americana alugou em Moscou. Nunes foi impedido de ir: ficou no hotel, para
não causar ainda mais problemas para a CBF.
Os encarregados
de tentar limpar a imagem do Brasil foram Fernando Sarney, vice-presidente da
CBF e integrante do Conselho da Fifa, e Rogério Caboclo, diretor-executivo da
confederação. Sarney fez um discurso para tentar acalmar os ânimos dos cartolas
sul-americanos, furiosos com Nunes. Claudio Tapia, presidente da AFA, a
Associação de Futebol da Argentina, falou em traição.
- A CBF está
sempre alinhada com a Fifa e a Conmebol. Qualquer decisão diferente, sempre
será uma decisão pessoal. A CBF está sempre ao lado da Conmebol – declarou
Sarney para uma plateia na qual estavam o presidente da Fifa, Gianni Infantino,
e a alta cartolagem da Conmebol e da candidatura norte-americana à sede da Copa
de 2026.
Enquanto Sarney
discursava, Rogério Caboclo falava pessoalmente com os dirigentes que se
sentiram traídos pelo voto de Nunes. A estratégia funcionou parcialmente.
Alguns entenderam que a CBF tem um presidente que combina uma coisa e faz
outra. Outros viram na manobra uma tentativa de atribuir a Nunes o que seria
uma posição institucional do futebol brasileiro.
E também não
faltou quem lembrasse que, por fazer parte do Conselho da Conmebol – a
instância que assinou o acordo quebrado pelo Brasil -, o presidente da CBF,
Antônio Carlos Nunes, recebe um salário de US$ 20 mil.
De Moscou, Rússia, Martin Fernandez, de Globo.com, em
14/06/2018, às 19h33
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