Corrupção e privilégios mantêm Lula
preso
Por Aldo
Fornaziere (*)
Dilma Rousseff foi derrubada
por um esquema corrupto entranhado nas profundezas mais tenebrosas da história
do Brasil, que se constituiu na descoberta e na colonização e que se prolonga
até os nossos dias. O Brasil foi colonizado por criminosos, governado por
corruptos, por promotores de extermínio de índios, por estupradores, por
escravocratas, por espoliadores que nunca tiveram misericórdia nem piedade pelo
sofrimento alheio e dos escravos e trabalhadores espezinhados que construam as
suas riquezas. Esta bestialidade desumanizada foi constituindo a mentalidade de
uma elite perversa, sanguinária e predatória. Mesmo que a elite se renovasse e
trocasse de setores, a mentalidade pervertida continuou e mesma. Os principais
postos do Estado sempre foram ocupados, ao longo dos tempos, por gente
portadora de mentalidade assassina, predatória, corrupta.
Raros foram os momentos da nossa história em que pessoas de índole
honesta, com propósitos universalizantes, orientados para o bem comum, ocuparam
altos cargos na hierarquia estatal ou nas instâncias políticas. Essa
mentalidade criminosa e delinquencial incrustou-se na farsa da Independência,
na farsa da Proclamação da República e em tantos outros episódios retrógradas
que marcaram o século XX e deste pouco de século XXI da nossa história.
Se em determinados momentos a mentalidade criminosa das elites governou
com certo pudor, usando a técnica do disfarce, ou justificando a violência
aberta como foi o período da ditadura militar, com o golpe que derrubou Dilma,
o despudor, a desfaçatez, a imoralidade, a indecência, a impudência se
mostraram à luz do dia, sem rubor nas faces. Os artífices deste tormento não
tiveram nem o cuidado de se justificar junto àqueles que enganaram: derrubar a
Dilma em nome do combate à corrupção para instalar o governo mais abertamente
corrupto da história do país. Aqueles que foram enganados passaram à condição
de humilhados. Surgiu daí a conjugação da impotência e do imobilismo: de um
lado os enganados humilhados e, o outro, o dos derrotados atordoados.
O esquema corrupto e criminoso não visava apenas derrubar Dilma, mas
impedir a vitória de um candidato que representasse os setores populares nas
eleições de 2018 - particularmente a vitória do presidente Lula. Por que? Porque
Lula, acima de todos, e outros possíveis vitoriosos representam aquele sentido
dos direitos universalizantes, orientados para o bem comum, que as elites
querem impedir nesse país. Quanto mais igualdade e justiça, menos corrupção e
privilégios. Então, neste país, as elites precisam impedir o avanço da
igualdade e da justiça, dos direitos, porque isto bloqueia a corrupção e os
privilégios.
Mas não são apenas os representantes políticos das elites corruptoras e
corruptas que querem impedir que os valores da igualdade e da justiça se tornem
minimamente efetivos neste país. Os altos funcionários do Judiciário, do
Ministério Público, da Receita e dos organismos de segurança são a outra face
do esquema corrupto e criminoso que governa o país. Os governos petistas deram
autonomia, aparelhamento e leis para que esses setores pudessem combater a
corrupção. Eles voltaram essa autonomia, esses instrumentos e essas leis
justamente contra o PT. Por que? Porque esses setores estão corrompidos pelos
altos salários e pelo estouro dos limites constitucionais desses altos salários
e pela série de privilégios inescrupulosos, escandalosos e corruptos, a exemplo
do auxilio moradia, que favorecem esses setores.
Mesmo que um salário de R$ 30.000 seja um salário dentro da lei é um
salário que expressa uma forma de corrupção num país em que mais de 100 milhões
de pessoas ganham até um salário mínimo e em que a renda média do brasileiro é
de R$ 1.268. Para manter um salário de mais de R$ 20.000 no setor público é
preciso que falte educação, falte saúde, falte remédios, falte cultura falte
direito para o povo pobre das periferias.
Os juízes, os procuradores, os delegados, os altos funcionários da Receita
etc., excluindo-se as exceções, são inimigos do povo porque as necessidades do povo
são inimigas dos seus altos salários e de seus privilégios. E, em sendo
inimigos do povo, são inimigos dos políticos que lutam para fazer valer os
direitos do povo. São os maiores inimigos de Lula porque Lula é a principal
potência e possibilidade para introduzir mecanismos de igualdade e de justiça
no Brasil. Mesmo que Lula favoreça e instrumentalize esses setores, eles serão
inimigos de Lula ou de qualquer outro que represente as lutas por igualdade,
justiça e direitos.
Se no setor político os políticos que representam esses esquemas
criminosos e corruptos perderam o pudor em mostrar sua face vil, anti-social,
antinacional e antipopular, no Judiciário também o despudor, a desfaçatez, a
imoralidade, a indecência, a impudência se instalaram como modus operandi de
juízes, de desembargadores e de ministros das Cortes superiores. Foi o que se
viu com Moro, um juiz fora da lei, com Gebran Neto, com Thompson Flores, com
Raquel Dodge com Laurita Vaz que, na última semana, não teceram o manto da
misericórdia, mas forjaram a espada da injustiça, do ódio e da impiedade para
manter Lula injustamente preso. Esta ordem templária do mal não teme em violar
as leis e a Constituição, em destruir a hierarquia e os procedimentos, em
rasgar a jurisprudência, em condenar sem provas, em se elevar na condição
acusador e de juiz a exemplo dos tribunais da Inquisição, em condenar
inocentes, seja porque são alvos dos seus ódios, seja porque os vêem como
ameaças aos seus interesses.
Nada detém essa horda que pisoteia a Constituição. Negam aos outros juízes
e desembargadores o direito de praticar aquilo que a função prescreve e que
eles mesmos praticam. Instalaram o reino da exceção, no qual, a vontade
arbitrária deles substitui as leis e a Constituição. Perseguem colegas, como
estão perseguindo o desembargador Rogério Favreto, porque não aceitam quem
contrarie os seus desmandos. O Congresso não os detém até porque já não há mais
Congresso. O Executivo não os detêm até porque o governo está desmoralizado.
Nem o STF os detêm porque o STF está tomado pela desordem anárquica e abre
espaços para o motim e para a indisciplina. Parecem não temer mais nenhum poder
humano e nem mesmo o castigo de um Deus irado, tal certeza da impunidade que
amealharam.
Se no Brasil nunca houve democracia efetiva, só sobram destroços de
República porque já não há divisão de poderes. O Brasil vai sendo arrastado
para uma destruição sem fim, para o descontrole da violência, vai se afastando
da estrada da civilização e vai se embrenhando para dentro da sua própria dor e
desesperança. Esta impotência da vida cívica, da coragem e da virtude abre as
portas para que os demônios do mal se sintam confortáveis e bem quistos. O que
dizer de um país que aceita que Bolsonaro, um candidato à presidência da
República, pregue o massacre de camponeses pela política, como ocorreu no Pará?
Bolsonaro não é um acaso. Ele é filho do golpe, camarada de Moro e de muitos
outros juízes, um rebento do PSDB, conviva de empresários, visitante da grande
mídia e até tolerado por progressistas.
Vivemos num país em que tudo é normal: Lula preso é normal, Bolsonaro
pregando o crime é normal, uma quadrilha no governo é normal, juízes rasgando a
Constituição é normal, o crime e a violência são normais, a falta de saúde e de
outros direitos é normal. O escandaloso perdeu todo o sentido e todo o status.
Anormal é querer tratar o escandaloso como inaceitável. Junto com a corrupção e
os privilégios, essa trágica normalidade, esta impávida passividade, são outras
causas que mantêm Lula preso. Como não temos uma história de lutas gloriosos e
nem heróis míticos donde possamos nos socorrer, precisamos olhar como outros
povos se libertaram para seguir-lhe o exemplo. É preciso que a coragem e a
bravura enfrentem a impiedade e a injustiça e que o nosso valor faça arder as
lutas, pois só nelas reside a esperança
(*) - Aldo Fornaziere é Cientista Político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP). Publicado em Brasil 247, 18/07/2018
(*) - Aldo Fornaziere é Cientista Político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP). Publicado em Brasil 247, 18/07/2018
Nenhum comentário:
Postar um comentário