Globo pede fora Temer e
diz que pega mal uma justiça que só bate em Lula

Um
dos principais pilares do golpe de 2016, que derrubou a presidente honesta
Dilma Rousseff e instalou no poder Michel Temer, o primeiro ocupante da
presidência denunciado por corrupção na história do Brasil, o Globo voltou a
pedir a queda de seu ex-aliado e fez uma crítica à seletividade do Poder
Judiciário, que usa critérios diferenciados para o ex-presidente Lula.
"Ora,
o que o Ministério Público Federal entende sobre o comportamento do
ex-presidente Lula nas relações promíscuas com empreiteiras precisa valer para
todos. Não pode existir uma metodologia de interpretação de fatos entre
procuradores e juízes que só valham para o PT. Evidências e indícios são provas
válidas para que se abram processos. Isso tem acontecido com vários políticos,
Lula um deles. Inconcebível é fazer de conta que nada houve de pelo menos
estranho no relacionamento entre Temer, JBS, Joesley, Loures e outros",
diz o texto.
Leia,
abaixo, a íntegra do editorial do Globo:
Aprovar processo contra Temer é a
melhor alternativa
Reformas
corretas de Temer não justificam que ele fique imune a investigações e a
processos
Depois
de quase um ano, o país volta a acompanhar uma votação no Congresso para
decidir o destino do presidente da República. No caso de Dilma Rousseff, o
processo de impeachment, por crime de responsabilidade, por desmandos fiscais,
foi encerrado em 16 de agosto, no Senado, com o impedimento da presidente
petista. Hoje, seu então vice, Michel Temer, enfrenta outro tipo de escrutínio:
um pedido da Procuradoria-Geral da República para que a Casa permita ao Supremo
Tribunal deliberar sobre se o processa, como deseja a PGR, por corrupção
passiva.
Duas
decisões sobre o futuro de um presidente em tão pouco tempo, longe de
diagnosticarem alguma avaria grave nas instituições, atestam, ao contrário, o
saudável funcionamento delas. Têm resistido, inclusive, a propostas
heterodoxas, contra a Constituição, como a antecipação das eleições de 2018,
enquanto sinalizam que as únicas saídas para a crise são as estabelecidas na
Carta — a Câmara nega o pedido da PGR, ou o aceita; neste caso, fica-se à
espera de os 11 ministros do Supremo abrirem ou não processo contra Temer.
Caso
abram, o presidente será afastado por até 180 dias, assumindo Rodrigo Maia,
presidente da Câmara. Se for condenado, perde o cargo, e Maia convoca eleição
indireta para 30 dias depois. Absolvido ou caso nada aconteça em seis meses,
Michel Temer volta ao Planalto. Não há o que discutir.
Também
não existe dúvida sobre qual o melhor voto a ser dado na sessão que decidirá o
destino do pedido da PGR: é permitir que o Supremo julgue Michel Temer. Talvez
sequer ocorra esta sessão. Pode ser que pelo fato de o Planalto, por não ter
força, assim como a oposição, para garantir o quórum mínimo de 342 deputados e
votar o relatório em favor de Temer, do deputado tucano Paulo Abi-Ackel (MG),
fique tudo pendente, e o governo assuma o discurso de que vale este
relatório.
Assim,
tudo continuará como está. Instável, inseguro, até outubro de 2018, mês da
eleição. Pode-se, ainda, aguardar nova acusação da PGR, por outros crimes —
obstrução da Justiça ou participação em organização criminosa. Nessa hipótese,
repete-se o rito.
Hoje
ou quando for a votação, e mesmo que ela não ocorra, estão em confronto, nas
acusações a Michel Temer e na sua defesa, duas concepções do que é exercitar a
política com ética. Numa, tudo pode ser relevado, se o governo tem propósitos
corretos na economia, por exemplo. Na outra, valem a lei e a ética, independentemente
de ideologias e partidos.
O
vice-presidente recebeu de fato uma herança maldita, devido à decisão de Dilma,
sob as bênçãos de Lula e PT, de aproveitar a crise mundial deflagrada em 2008/9
para aprofundar o “novo marco macroeconômico”, no velho modelo
nacional-populista de intervenção do Estado na economia, inspirado nos
pensamentos fracassados da esquerda latino-americana do pós-guerra. Sabe-se o
que aconteceu: recessão profunda, histórica, 14 milhões de desempregados e
inflação. Os juros precisaram ficar em patamar ainda mais elevados, o que, em
um primeiro momento, agrava a recessão, um efeito colateral inevitável. Mas,
com o passar do tempo, o ajuste avançou, embora tenha estancado com a crise
política deflagrada pela conversa nada republicana do presidente com o
empresário Joesley Batista, origem do pedido de investigação da PGR, divulgado
pelo GLOBO.
Temer
assumiu com uma competente equipe econômica e estruturou uma correta agenda de
reformas, em que se destacam as da Previdência e a trabalhista. Em função
disso, defende-se a permanência dele no Planalto, e faz-se vista grossa ao que
aconteceu naquela noite de março nos porões do Palácio do Jaburu, em que o
presidente recebeu o empresário do grupo JBS, Joesley Batista, este com um
gravador no bolso.
Repete-se
o truque do PT, de justificar a participação de estrelas do partido na
roubalheira do mensalão e petrolão pela causa do combate à pobreza. É um erro:
nada pode atenuar o crime de corrupção ou qualquer outro. Ter este
comportamento é praticar a política miúda. Significa não aproveitar o momento
histórico do enfrentamento que organismos de Estado fazem dos desvios do
dinheiro do contribuinte no âmbito do Executivo e Legislativo, para que, enfim,
se dê um choque forte de ética na política e seja estabelecido para valer o
princípio republicano de que a lei vale de fato para todos.
Confirmada
a autenticidade do áudio por peritos da Polícia Federal, resta entender o
sentido claro do entrecortado diálogo entre Temer e Joesley, e complementá-lo
com o vídeo de Rodrigo Loures — que agendara aquela visita de Joesley ao
presidente —, correndo em uma rua de São Paulo com uma maleta em que estavam R$
500 mil. Era propina acertada pelo empresário com o deputado suplente do PMDB
paranaense, que Temer indicara a Joesley para resolver “tudo”, inclusive uma
pendência com a Petrobras no Cade, em torno do preço do gás fornecido pela
estatal a uma termelétrica do JBS.
Os R$ 500 mil eram uma parcela pelo serviço
prestado pelo representante de Temer, acusa a PGR. O conjunto desta obra é
complementado por depoimentos do empresário e de um diretor da JBS que
participou dos acertos com Loures, Ricardo Saud.
Ora,
o que o Ministério Público Federal entende sobre o comportamento do
ex-presidente Lula nas relações promíscuas com empreiteiras precisa valer para
todos. Não pode existir uma metodologia de interpretação de fatos entre
procuradores e juízes que só valham para o PT. Evidências e indícios são provas
válidas para que se abram processos. Isso tem acontecido com vários políticos,
Lula um deles. Inconcebível é fazer de conta que nada houve de pelo menos
estranho no relacionamento entre Temer, JBS, Joesley, Loures e outros.
Lula
está para a OAS no caso do tríplex do Guarujá como Michel Temer para a JBS no
assunto do gás da termelétrica. Sem falar na triangulação com Joesley, Eduardo
Cunha e Lúcio Funaro, um relacionamento também suspeito, mas ainda na dependência
de delações e investigações. Assim como as instituições prestam conta à
sociedade no desmantelamento do petrolão, em que se lambuzaram PT, PMDB e PP, a
nação precisa ter inúmeras dúvidas respondidas sobre a atuação do presidente
Michel Temer nesses meandros dos subterrâneos das finanças ocultas da política.
Também por isso, ele precisa ser processado. E nisso as próprias reformas serão
ajudadas. Um presidente fraco, sob suspeição, é que não conseguirá tocá-las.
De Brasília, Brasil 247, 02/08/2017
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